Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 24 de outubro de 2006.
No último sábado, aproximadamente 200.000 trabalhadores
e jovens saíram às ruas em cinco grandes cidades
alemãs (Berlin, Stuttgart, Frankfurt, Dortmund e Munique)
para protestar contra os cortes de benefícios sociais impostos
pelo governo anterior, composto pelo Partido Social-Democrata
(PSD) e PartidoVerde, e pelo governo atual, formado pela coligação
entre os partidos conservadores - União Democrática
Cristã (UDC) e União Social Cristã (USC)
- e o PSD.
As manifestações foram organizadas pela Federação
dos Sindicatos alemães (DGB). Os sindicalistas expressaram
sua indignação e frustração diante
das políticas do atual governo e de seu antecessor, que
elevou a desigualdade social a níveis sem precedentes.
Os discursos dos sindicalistas contrastaram com sua colaboração
diária com o governo. Muitos contratos recentes que resultaram
no fechamento de fábricas, perda de empregos, cortes nos
salários e ataques às condições de
trabalho continham a assinatura dos mesmos sindicalistas que denunciaram,
nas manifestações de sábado, os cortes de
benefícios, o desemprego e o crescimento da miséria
entre a população trabalhadora.
O cinismo dos sindicalistas foi reforçado pelo seu fracasso
em organizar um único protesto numa cidade do leste alemão,
onde o desemprego e a miséria são o dobro daquelas
existentes no oeste do país. Mesmo ignorados pelos burocratas
do sindicato, muitos trabalhadores do leste viajaram a Berlim
para expressar seu desgosto e indignação com a política
do governo, bem como em relação ao vergonhoso papel
representado pelos próprios sindicalistas.
Por volta de 60.000 trabalhadores se manifestaram na capital
Alemã, Berlin, carregando cartazes e faixas de protesto
contra as políticas do governo que conduziram a uma deterioração
das condições de vida de milhões de trabalhadores
alemães. Muitos cartazes abordavam pontos específicos,
denunciando os ataques de amplo alcance do governo em relação
a questões sociais, como educação (o aumento
do número de alunos por sala de aula e a falta de professores),
o declínio na aprendizagem dos jovens e o corte dos subsídios
(incluindo planos executados pelo PSD para aumentar a idade mínima
da aposentadoria para 67 anos). Devido ao crescimento da miséria
na Alemanha, muitos manifestantes vestiam coletes contendo o slogan
Empregados, mas Pobres.
Fundamental para as manifestações foi a discussão
pública, da semana passada, sobre a então chamada
classe baixa na Alemanha. Uma pesquisa oficial revelou a existência
de amplos níveis de pobreza em todo o país, incluindo
mais de 25% de todos os cidadãos que vivem no leste da
Alemanha. Outras estatísticas apontavam para o crescimento
da insegurança e a crescente desilusão em relação
a todos os partidos políticos oficiais.
A medida que tem contribuído mais para a deterioração
das condições de vida é a Hartz IV, lei anti-benefícios
implementada pelo PSD-Verde. Enquanto os sindicalistas, nas manifestações,
chamavam atenção para o crescimento da divisão
social na Alemanha e a presente ameaça à democracia,
evitava-se qualquer menção ao seu próprio
papel no desenvolvimento e implementação da Hartz
IV.
O principal orador do comício da cidade de Dortmund
foi Jürgen Peters, o dirigente do sindicato da IG Metall,
o maior sindicato da Alemanha e um dos maiores do mundo. Falando
do centro de ferro e aço do Ruhr, Peters criticou as políticas
da atual coligação, mas não fez nenhuma menção
ao seu próprio papel na implementação de
tais políticas anti-sociais. Como presidente do sindicato
da IG Metall e líder do PSD, Peters enviou membros de seu
sindicato para participar na Comissão da Hartz. Peter Hartz,
outro líder do PSD e companheiro de Peters no partido e
na IG Metall, é um dos maiores defensores de cortes de
benefícios da história do pós-guerra na Alemanha.
O principal orador em Berlin, Frank Bsirske, presidente do
sindicato dos servidores públicos- Verdi - e membro do
Partido Verde, reafirmou a postura hipócrita da burocracia
sindicalista. Bsirske denunciou o crescimento da desigualdade
social na sociedade alemã, expressa pelo crescente lucro
e pelo boom dos salários dos executivos das grandes empresas
e dos bancos, por um lado, e a crescente miséria social,
por outro.
Ele afirmou que a desigualdade social não foi
um problema demográfico, mas uma bomba-relógio social
que teve de ser desarmada. Ele atacou as propostas
do governo que visam aumentar o imposto sobre valor de mercadorias,
que, segundo ele, colocará em risco a recuperação
da economia alemã; exigiu um salário mínimo,
e reivindicou uma distribuição mais justa dos lucros.
Num duro golpe aos trabalhadores do leste europeu, Bsirske denunciou
os trabalhadores poloneses que, segundo ele, estão colocanso
em risco as perspectivas dos trabalhadores alemães, pois
estão dispostos a trabalhar por um euro por hora, no estado
de Rhineland.
Enquanto criticava o crescimento da pobreza e do ranking
de trabalhadores miseráveis na Alemanha, Bsirske
não mencionou a sua responsabilidade ao assistir tal processo.
Foi Bsirske quem colaborou com o Senador de Berlin, Harald Wolf,
para impor um corte de 10% nos salários dos trabalhadores
do transporte de Berlin; neste ano, o sindicato Verdi desempenhou
papel fundamental de fura-greve numa série de greves de
médicos e servidores da saúde. Além disso,
durante os sete anos de governo do PSD-Verde, o Verdi desempenhou
papel decisivo na supressão da oposição à
legislação deste governo anti-benefícios.
Em diversos momentos, o discurso de Bsirske foi interrompido
por protestos de uma delegação de trabalhadores
que frequentemente entram em greve em Berlin, e que ficaram com
seus cartazes próximos ao palanque, de frente para a multidão.
Trabalhadores da fábrica da Bosch Siemens em Berlin gritavam
Nós queremos greve!. Dois terços dos
trabalhadores aprovaram recentemente a continuidade da greve,
a fim de defender seus empregos. Entretanto, os líderes
sindicais que os representam estão aconselhando-os
a voltarem ao trabalho.
Em Stuttgart, o presidente da DGB, Michael Sommer, advertiu
sobre as conseqüências de longo prazo para a democracia
na Alemanha advindas do crescimento da desigualdade social, declarando
que as vitórias nas eleições dos neo-nazis,
a descrença cada vez maior na política, o afastamento
dos partidos das pessoas, o fato de menos e menos pessoas tomarem
parte nas eleições deveria ser um aviso, e não
apenas para nós.
Quando Sommer (membro do PSD desde 1981) fala de um aviso,
e não apenas para nós, ele está advertindo
os círculos de decisões e negócios alemães
para o fato de que eles não podem excluir os sindicatos
da elaboração de políticas futuras. Sommer
insistiu em criticar os planos do Vice-chanceler Franz Müntefering
(PSD) de aumentar a idade mínima para aposentadoria e reivindicou
o fim à política de ultimatos, que caracterizou
o último período do governo do PSD-Verde, de Gerhard
Schöder.
Há dois anos, amplas mobilizações contra
a Hartz IV e outros cortes de benefícios exerceram um papel
fundamental na decisão do então Chanceler Schröder
em antecipar as eleições, a fim de abrir caminho
para um governo mais hábil em lidar com a situação
e dar prosseguimento a essa agenda de grandes negociações.
Significativamente, a onda de protestos e manifestações
contra a Hartz IV em 2003 e 2004 foi organizada independentemente
dos sindicatos.
Nestes últimos tempos, os sindicalistas têm mandado
claros sinais à coligação do governo. Nas
manifestações de sábado, eles falaram por
cima dos manifestantes. Seus discursos foram endereçados
aos mais influentes círculos econômicos e políticos
da burguesia alemã. Para o seu próprio bem,
nos coloque a bordo, e nós faremos o máximo para
bloquear um levante social. Tal era o conteúdo oculto
dos discursos vindos dos palanques.
E a mensagem foi recebida. Entre aqueles que aplaudiam mais
calorosamente os discursos em Berlin estava o partido de esquerda
- Partido Social-Democrata (PSD) - o senador das finanças
de Berlin, Harald Wolf, e o presidente do partido de esquerda-PDS,
Lothar Bisky. Na primeira fileira do comício de Frankfurt
estava o velho presidente do sindicato da IG Metall, Franz Steinkühler,
que iniciou a guinada à direita do sindicato em 1980. Forçado
a deixar o sindicato em 1993 devido a acusações
internas do sindicato, Steinkühler atualmente é proprietário
e gerente consultivo.
Membros e apoiadores do Socialist Equality Party fizeram
intervenções em vários comícios, distribuindo
milhares de cópias do panfleto Lutar contra os cortes
de empregos e benefícios numa perspectiva socialista internacional,
que foi muito bem recebido pelos manifestantes. Dezenas de assinaturas
foram coletadas em apoio ao manifesto do PSI do Sri Lanka, que
reivindica uma investigação sobre a morte de um
dos colaboradores do PSI, Sivaparagasam Mariyadas.