Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 9 de fevereiro de 2007.
No 6 de fevreiro, cinqüenta e sete países assinaram
o tratado da ONU que proíbe governos de seqüestrarem
e prenderem indivíduos em ações secretas.
Washington, assim como diversos governos europeus, incluindo Inglaterra,
Alemanha, Espanha e Itália, se recusaram a assinar o tratado.
Na assinatura do tratado em Paris, o ministro das relações
exteriores francês, Philipe Douster-Blazy, comentou que
nossos amigos americanos estavam, naturalmente, convidados
para esta cerimônia; infelizmente, não foi possível
que eles se juntassem a nós.
O porta-voz do departamento de estado norte-americano, Sean
McCormack, comentou simplesmente que o tratado não
atendia às nossas expectativas. Entretanto, o conteúdo
do tratado pode explicar porque eles não compareceram.
O tratado, que foi denominado de Convenção Internacional
pela Proteção de Todas as Pessoas ao Desaparecimento
Forçado, convoca todas as nações a adotar
a proibição absoluta às prisões
secretas e promover investigações a respeito dos
desaparecidos. Ela ainda obriga cada partido que esteja
no governo a garantir que as vítimas de rendições
e detenções secretas tenham direito a indenizações.
É necessário que cada nação assine
o tratado para que as autoridades competentes possam encaminhar
o processo das pessoas suspeitas de seqüestros em qualquer
parte do mundo. A convenção ainda estabelece um
comitê que deve monitorar a implementação
do tratado e agir em eventuais abusos.
Agentes da Inteligência Central que estiverem ativamente
envolvidos em rendições ao redor do mundoe
altos oficiais que os encarregarampoderiam estar violando
diretamente o tratado. As ações destes agentes foram
autorizadas e defendidas por George W. Bush e outros membros de
seu governo. Em setembro passado, o presidente dos EUA reconheceu
abertamente a existência de uma rede de comunicação
de prisões secretas executada pela CIA, e insistiu que
ela deveria continuar a operar.
A prática norte-americana de prender suspeitos em nome
da guerra ao terror foi perdoada pelo congresso dos
EUA, que adotou em setembro o Ato de Comissões Militares,
possibilitando o encarceramento de prisioneiros na Baía
de Guantánamo e outros campos de detenção
americanos ao redor do mundoum grande número desses
é secreto. Prisioneiros liberados de Guantánamo
e outros campos de prisão denunciaram práticas de
tortura. Oficiais franceses que lideraram o esforço para
instituir a prisão contaram mais de 51.000 pessoas que
desapareceram pelas mãos de seus governos em 90 países,
desde 1980. A grande maioria desses indivíduos41.000nunca
recebeu nenhuma satisfação e as investigações
e encaminhamentos de seus casos continuam um mistério.
Durante anos, as famílias dos desaparecidos e as organizações
pelos direitos humanos reivindicaram à ONU a elaboração
de um tratado internacional proibindo tais desaparecimentos. Washington
diz que o papel desempenhado pelos agentes da inteligência
americana em tais desaparecimentos deve permanecer secreto e que
os responsáveis devem estar imunes a processos tanto nos
EUA quanto em outras cortes internacionais.
Alguns dos governos europeus que se recusaram a assinar o tratado
estiveram envolvidos como colaboradores nos seqüestros e
torturas ilegais de pessoas suspeitas de terrorismo, realizadas
pela CIA. Estimulado pelas notícias divulgadas na imprensa,
que envolvem parceiros europeus da CIAlevantando inclusive
suspeitas da existência de instalações de
detenção no leste europeuo Conselho da Europa
pediu um relatório para investigar tais afirmações.
O relatório do Conselho descreveu uma teia global
de instalações carcerárias administradas
por agências do governo americanomuitas delas completamente
clandestinas. O Conselho determinou que as acusações
feitas contra os EUA e os 14 governos europeus eram substancialmente
verdadeiras. Os países que tiveram governos stalinistascomo
a Polônia, a Romênia, e as ex-repúblicas da
Iugoslávia, Macedônia e Bósnia-Herzegovinadesempenharam
um papel essencial na colaboração com a CIA.
O relatório preparado por Dick Marty, relator do conselho,
expôs diários de bordo de vôos realizados por
organizações da CIA e os confrontou com as notícias
de conhecidos desaparecimentos. O relatório deu ainda detalhadas
explicações de 17 pessoas que disseram ter sido
seqüestradas, rendidas e torturadas em campos de prisão
americanos.
Essas vítimas disseram ter sido algemadas, vendadas
e revistadas por grupos de agentes da CIA que, usando máscaras,
os seqüestraram. As roupas dos detidos eram cortadas e eles
eram submetidos a uma revista geral. Alguns apanhavam, e outros
tiveram objetos forçadamente introduzidos em seus
ânus.
Depois algemavam a vítima, tampavam seus ouvidos e colocavam
uma bolsa em sua cabeça; a vítima era então
levada a um local desconhecido. Em alguns casos a pessoa
era drogada a fim de impedir que soubesse alguma coisa sobre o
trajeto pelo qual passou, divulgou o relatório.
O relatório descreveu o caso de Binyam Mohamed al Habashi,
um cidadão etíope com residência no Reino
Unido. Al Habashi foi seqüestrado no Paquistão e submetido
à tortura enquanto era mantido no Marrocos, de acordo com
cartas e denúncias de sua família e de seu advogado.
Mais tarde ele foi transferido para Guantánamo.
O primeiro ministro britânico, Tony Blair, liberou o
relatório do Conselho da Europa, dizendo que ele não
continha nada de novo, e ao mesmo tempo defendeu a
prática de execuções como perfeitamente legais.
A Inglaterra se recusou a assinar o novo tratado que proíbe
estas práticas.
Dois casos criminosos que estão em andamento, envolvendo
atividades de agentes da CIA na Europae com a colaboração
de governos europeuslevantaram novas suspeitas sobre a prática
ilegal da execução.
No dia 31 de janeiro, o escritório público de
processos em Munique lançou mandados de prisão contra
13 agentes da CIA acusados do seqüestro, tortura e execução
de Khaled el-Masri. El-Masri, um cidadão alemão
de descendência libanesa, foi preso em dezembro de 2003
na Macedônia como suspeito de terrorismo e, após
ser seqüestrado por agentes da inteligência americana,
foi levado para o Afeganistão, onde foi torturado e interrogado
durante quatro meses. Depois de ficar evidente o equívoco
de sua prisão, el-Masri foi enviado aos Bálcãs
e abandonado numa floresta próxima à fronteira da
Albânia.
Uma comissão parlamentar de inquérito ainda investiga
o caso de el-Masri, procurando determinar até que ponto
as autoridades alemãs estavam informadasou mesmo
envolvidasdo seqüestro de el-Masri.
A chanceler Angela Merkel da União Cristã Democrática
(Christian Democratic Union - CDU)tentou afastar
a hipótese do envolvimento do governo alemão no
caso. A Alemanha também se recusou a assinar o novo tratado
que proíbe as prisões secretas.
Na Itáliaoutro país europeu que se recusa
a assinar a proibiçãoo escritório de
processos públicos lançou um mandado contra outros
26 agentes da CIA envolvidos no seqüestro do clérigo
muçulmano Abu Omar, no ano de 2003.
Abu Omar foi seqüestrado à luz do dia em Milão,
sendo transportado num micro-ônibus à base da Força
Aérea Americana, em Aviano. Ele foi levado de avião
para a base da Força Aérea Americana em Ramstein,
Alemanha, e depois para o Cairo, onde foi jogado na prisão
e torturado. Ele permanece preso até hoje, sem qualquer
julgamento, na conhecida penitenciária de Thora, no Cairo.
O ex-diretor do Serviço Secreto do Exército Italiano
(Italian military secret service - SISMI) foi acusado de
ajudar nas ações da CIA. Um dos principais obstáculos
para o a continuidade do processo de julgamento contra os agentes
da CIA é o papel desempenhado pelo primeiro ministro italiano,
Romano Prodi, que declarou que as informações importantes
relacionadas à cooperação entre a CIA e o
SISMI constituem um segredo de Estado.