Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia21 de janeiro 2008.
Pierre Lambert, dirigente histórico da Organzação
Comunista Internacionalsta francesa (OCI) e atualmente do Parti
des Travailleurs (Partido dos Trabalhadores), morreu em Paris
aos 87 anos em 16 de janeiro depois de uma longa doença.
Lambert foi um dos últimos militantes que se aliou à
IV Internacional durante o período em que Trotsky ainda
estava vivo, representando um papel importante na organização
no período pós II Gerra.
Nascido em 9 de Junho de 1920, filho de uma família
de judeus imigrantes russos, Pierre Boussel (seu nome de batismo)
entrou no movimento de juventude comunista quando tinha apenas
14 anos. Um ano depois, foi expulso por criticar a aliança
de Stalin com o Governo francês de Pierre Laval. Ele se
tornou militante do movimento de juventude comunista, no qual
os trotskystas ganhvam rápida influência, e foi muito
ativo no movimento trotskysta durante a guerra.
No início dos anos 50, a IV Internacional passou a sofrer
fortes influências de uma tendência revisionista,
que atribuía um papel progressista ao Stalinismo graças
às nacionalizações realizadas na Europa do
Leste. Essa tendência-guiada por Michel Pablo e Ernest Mandel-defendia
o entrismo nos partidos comuinistas. Se isto realmente tivesse
acontecido, provavelmente teria resultado na liquidação
da IV Internacional.
Graças aos esforços da grande maioria da seção
francesa, a IV Internacional se opôs energicamente ao revisionismo
Pablista. Membros importantes como Marcel Bleibtreu e Daniel Renard,
escreveram contribuições valiosas contra o rumo
liquidacionista dos pablistas. Pierre Lambert apoiou a maioria
do partido, mas não resta qualquer contribuição
sua contra o revisionismo Pablista.
Em 1953, a maioria do PCI Francês (que só mais
tarde passou a se chamar OCI) ficou ao lado do Comitê Internacional
da Quarta Internacional (CIQI), que foi criado pela iniciativa
do Partido Socialista dos Trabalhadores dos EUA (SWP) para defender
o programa da IV Internacional contra o Revisionismo Pablista.
Foi durante essa época que Lambert teve um importante papel
de liderança na Seção Francesa.
Entretanto, ao fim dos anos 50, O PCI de Lambert já
demonstrava vários sintomas de desorientação
e desmoralização. O PCI interpretava o retorno do
General De Gaulle ao poder e o estabelecimento da V República
em 1958 como um golpe de estado Bonapartista, com uma visão
totalmente pessimista da capacidade de luta da classe operária,
chegando a se configurar como um movimento semi-clandestino durante
os anos que se seguiram.
No começo dos anos 60, a OCI se opôs a reunificação
da IV-Comite Internacional com os Pablistas, que vinha sendo promovida
pelo SWP (que realmente levou a reunificação a cabo
alguns anos depois). No entanto, a OCI teve um papel totalmente
secundário nessa luta. O verdadeiro combate político
e teórico contra a reunificação com os pablistas
foi liderado pela Liga Socialista dos Trabalhadores (SLL) liderada
por Gerry Healy.
Durante a década de 60, os sinais de uma crise crescente
na OCI de Lambert se tornaram cada vez mais evidentes quando passou
a questionar a luta do Comitê Internacional-IV contra o
Pablismo. Inicialmente isso se manifestava com uma alegação
de que a IV Internacional estava fraca e deveria ser reconstruída.
A SLL Inglesa se opôs veementemente a essa posição.
Em 1967 a SLL escreveu a OCI: O futuro da Quarta Internacional
está representado no ódio de milhões de trabalhadores
aos Stalinistas e reformistas que traíram a luta. A Quarta
Internacional deve lutar conscientemente pela direção
desse movimento....Apenas este combate contra o revisionismo pode
preparar seus quadros para assumir a direção de
milhões de trabalhadores mergulhados na luta contra o capitalismo
e contra a burocracia...O combate contra o Pablismo e o treinamento
de quadros e partidos na base deste confronto é a vida
da Quarta Internacional desde 1952. (Trotskyism versus
Revisionism, vol. 5, London 1975, pp. 107-14).
Às vésperas dos grandes conflitos de 1968, a
SLL também advertia sobre as conseqüências do
ceticismo da OCI: Agora a radicalização dos
trabalhadores de Europa do Leste tem se espalhado rapidamente,
particularmente na França...Num momento decisivo como estes,
sempre existe o perigo de que um partido revolucionário
responda à situação não de forma revolucionária,
mas de forma a se adaptar à luta em que os trabalhadores
estão restritos pela sua própria experiência
sob sua antiga liderança-i.e. a sua confusão inicial
e inevitável. Tais revisonismos da luta por um partido
independente e do Programa de Transição geralmente
estão travestidas pelo discurso de se aproximar da classe
trabalhadora, unidade de todos na luta, não colocar ultimatos,
abandonar o dogmatismo, etc. (ibid., pp. 113-14).
Esse alerta não foi ouvido. As revoltas de 1968 impulsionaram
milhares de membros novos e inexperientes às fileiras da
OCI e de sua organização de juventude (AJS), enquanto
a direção da OCI se adaptava ao estado de confusão
generalizado. A reivindicação por uma frente
classista unificada- também criticada pela SLL em
1967 - se tornou a fórmula com a qual a OCI se adaptou
totalmente à burocracia social democrata e dirigiu as novas
forças recentemente conquistadas de volta aos velhos aparatos
burocráticos.
Não havia mais qualquer diferença de princípios
entre a visão da OCI e aquela dos Pablistas. A única
diferença era que a OCI se orientava em direção
à social democracia -uma repulsa ao Stalinismo que se adaptava
cada vez mais à social democracia anti-comunista - enquanto
os pablistas mantinham sua orientação em direção
aos partidos Stalinistas.
Em 1971, a OCI rompeu com o Comitê Internacional da Quarta
Internacional, sem clarificar as questões que formavam
a base desse racha. Por sua vez, a SLL se concentrava cada vez
mais no seu trabalho nacional na Inglaterra e perdeu o interesse
de clarificar questões internacionais, embora a OCI já
estivesse muito mais à direita do que se esperava nos anos
60. Nos anos 70 a OCI começava a desenvolver uma forma
específica de oportunismo político, que passou a
ser identificado com o nome de Lambert desde então.
A principal característica do Lambertismo é a
rejeição de uma mobilização política
independente da classe trabalhadora sob a bandera do marxismo
revolucionário. Ao invés disso, o Lambertismo luta
para influenciar representantes importantes nos sindicatos e nas
máquinas partidárias. A organização
de Lambert não falava para a classe trabalhadora, mas preferia
sussurrar nos ouvidos de certas personalidades importantes.
O jornalista Jamal Berraoui, antigo membro da organização
de Lambert no Marrocos, descreveu este fato em seu obituário
para o jornal Aujourdhui le Maroc. Ele escreve: Lambert,
durante os grandes combates da luta de classes, insistia enfaticamente:
Nós não somos a direção das
massas - ele preferia deixar este papel para os aparelhos
tradicionais. Investigando o movimento de massas, abrindo para
as massas uma perspectiva única, dando a elas palavras
de ordem apropriadas, sem substituir a si mesmo pelas direções
tradicionais - essa era sua linha.
Essa linha fora criada para dar uma cara de esquerda aos aparatos
burocráticos reacionários em tempos de crise, para
paralisar a classe trabalhadora e estabilizar o domínio
burguês. Nisso, Lambert foi, sem dúvida alguma, extremamente
bem sucedido, como foi recentemente reafirmado por
vários obituários da imprensa francesa1.
Um manobrista habilidoso, Pierre Lambert sabia como reunir
em torno de si várias energias e ainda achar meios de manter
certa modéstia, e dentro de seus limites, uma organização
efetiva, escreve o Le Monde. O jornal aponta inúmeras
ligações comprometedoras de Lambert. Entre elas,
ligações entre Lambert e a organização
maçônica Grand Orient de France, pela qual
circulou nos anos 70 Fred Zeller, que servira como secretário
de Trotsky; a influência da OCI na federação
sindical francesa Force Ouvrière (FO), cujo secretário
geral por longo tempo, Marc Lambel, foi amigo próximo de
Lambert; e ainda o controle da OCI sob a organização
estudantil MNEF, que administrava um esquema de previdência
dos estudantes.
De acordo com o jornal Libération, há
indícios de queLambert se reuniu regularmente com
o barão da imprensa Robert Hersant, e em 1995, às
vésperas dos grandes protestos contra as reformas previdenciárias
na França, teria comparecido a um jantar particular no
palácio presidencial juntamente com diversos outros funcionários
da FO.
No entanto, o resultado mais importante da ligação
de Lambert com a burocracia reformista é certamente o fato
de que diversos membros importantes do Partido Socialista passaram
por sua escola. O mais conhecido entre eles é Leonel Jospin,
quem esteve à frente do governo francês entre 1997
e 2002 e participou das eleições de 2002. Mas certamente
não foi o único.
Jospin aderiu a OCI quando ainda era um estudante, nos meados
da década de 60. Logo foi aconselhado a aderir ao Partido
Socialista, em 1971. Lá, ele ascendeu rapidamente nas fileiras
daqueles que eram próximos ao líder do partido,
François Mitterrand, quem garantiu o cargo de primeiro
secretário em 1981 a Jospin. Mitterrand, que sempre manteve
todos seus colegas de trabalho sob vigilância permanente,
certamente sabia sobre a filiação secreta de Jospin
à OCI e de suas relações com Lambert, o que
foi confirmado por fontes independentes.
O apoio da OCI, que no início da década de 70
tinha milhares de membros e cuja organização de
juventude Alliance des Jeunes pour le Socialisme (AJS) podia mobilizar
dezenas de mlihares, foi de fundamental importância para
Mitterrand. Este político burguês desmoralizado -
que havia servido por um breve período no regime de Vichy
e que era o ministro do interior e da justiça no ponto
mais alto da guerra em Argel - liderou o Partido Socialista em
1971 tentando garantir ao partido uma roupagem de esquerda.
O objetivo de Mitterrand era dar uma base nova e estável
para o domínio da burguesia na França - que havia
sido seriamente abalada pela greve geral e protestos estudantis
de 1968 - através de uma aliança com o partido comunista
que ele poderia dominar; algo que ele finalmente conquistou. A
OCI glorificou esta aliança da esquerda como
uma frente unificada dos trabalhadores e atacava qualquer
um da esquerda que a criticava.
Quando as relações entre a OCI e Mitterrand finalmente
esfriaram, Jospin e outros membros da OCI que haviam entrado no
Partido Socialista em 1971 não apenas permaneceram no partido;
em 1986 toda uma ala da organização de Lambert,
sob Jean Christophe Cambadélis, o líder do trabalho
estudantil, entrou no campo de Mitterrand. Cambadélis permaneceu
na Assembléia Nacional por 10 anos e hoje elevou-se a uma
das figuras de maior influência na hierarquia do Partido
Socialista.
No inverno de 1995/96, quando uma greve dos ferroviários
e serviços públicos durou por várias semanas,
abalando o regime de Jacques Chirac, a classe dominante buscou
exatamente essas pessoas para controlar a situação.
Em 1997, quando Lionel Jospin surgiu como primeiro ministro, o
governo francês era encabeçado por um homem que havia
trabalhado por quase 20 anos sob a disciplina de um movimento
supostamente Trotskysta.
O objetivo de Jospin era explorar sua imagem de esquerda para
manter a classe trabalhadora sob controle, enquanto promovia uma
política de privatizações e retiradas de
direitos que respondia aos interesses do capital financeiro. O
resultado foi devastador. A decepção generalizada
só beneficiou a frente de ultra-direita de Jean Marie Le
Pen, que então derrotou Jospin no primeiro turno das eleições
presidenciais de 2002 e desafiou Chirac no segundo turno.
Enquanto isso, Lambert tinha se voltado para um novo projeto,
fundando o Parti des Travailleurs (PT) em 1991. Embora este partido
seja controlado pela antiga OCI, ele se afirma como um partido
não Trotskysta; com a antiga OCI se apresentando como Courant
Communiste Internationaliste (Corrente Comunista Internacionalista)
ao lado de social democratas e Stalinistas como uma tendência
dentro do PT. Com a fundação do PT, a OCI tem, em
certa medida, criado seu próprio aparato burocrático.
O grupo alvo do PT não é de trabalhadores comuns,
mas trabalhadores do funcionalismo que por alguma razão
se desencantaram com a hierarquia do Partido Comunista ou Socialista
- geralmente porque suas aspirações carreiristas
não puderam ser atendidas. Na última eleição
presidencial, o PT se promoveu como o representante dos interesses
de 36 mil prefeitos franceses - uma massa de trambiqueiros e corruptos.
O centro do programa eleitoral era uma campanha pseudo-chauvinista
contra a União Européia, que fora declarada responsável
por todos os males da sociedade francesa.
Os seguidores de Lambert ainda exercem grande influência
nos sindicatos da FO, ainda que não seja a mesma influência
da época de Blondel.
A influência de Lambert não se limita a França.
No norte da África, América Latina, Turquia e outros
países, seus seguidores ainda seguem suas lições,
trabalhando dentro dos aparatos de partidos reformistas e dos
sindicatos, e geralmente nas alas mais à direita. Não
é coincidência alguma que o nome Parti des Travailleurs
é identico ao Partido dos Trabalhadores de Lula no Brasil.
Os seguidores brasileiros de Lambert tiveram papel fundamental
na fundação do PT no Brasil e provaram ser membros
leais, defendendo a máquina partidária contra qualquer
crítica vinda da esquerda2.
A vida e a herança de Lambert contém lições
importantes para a classe trabalhadora internacional. Elas mostram
o preço da política oportunista. Não é
apenas uma questão de defender opiniões e erros.
Em tempos de crise, o oportunismo se torna a última linha
de resistência da dominação burguesa.
O World Socialist Web Site publicará em breve
uma crítica mais extensa da vida de Lambert e seu significado.
1 Nota dos tradutores: não foi diferente a atuação
dos lambertistas no Brasil. Desde o início do PT de Lula,
os lambertistas procuravam se aproximar das lideranças
sindicais através de relações pessoais, beber
cerveja, etc..Boa parte deles, como Jospin, na França,
passaram para o outro lado: lembremos Palocci, Gushiken, Favre,
Clara Ant e muitos outros. 2 Nota dos tradutores: hoje os lambertistas
brasileiros ainda permanecem no PT, sendo conhecidos como "o
grupo do jornal O Trabalho". Não passam de uma corrente
insignificante que apenas tenta acobertar o papel totalmente traidor
do PT e do governo Lula.