Publicado originalmente em inglês no dia 21 de abril
de 2009.
A Cúpula das Américas, que teve fim no dia 19.04
em Trinidad e Tobago, foi aclamada pela maioria da mídia
como outro sucesso para o presidente dos EUA, Barack
Obama.
O New York Times, sempre criando ideologia, afirmou:
Líderes do hemisfério ocidental, inspirados
por um novo presidente americano, encerraram a reunião
de cúpula de dois dias proclamando um novo começo
para as relações na região, marcadas atualmente
por amargos desentendimentos com os Estados Unidos nos últimos
anos.
Boa parte da reportagem centrou-se no aperto de mãos
entre Obama e o presidente venezuelano, Hugo Chávez, retratado
por alguns como um sinal do pragmatismo do presidente americano,
enquanto condenado pela direita republicana como uma irresponsável
reverência a um inimigo.
Alguém dificilmente adivinharia que a declaração
final da cúpula seria assinada apenas pelo presidente-afitrião,
o presidente de Trinnidad e Tobago Patrick Manning. Vários
países recusaram-se a assinar porque o documento deixou
de mencionar Cuba e, como o esboço foi feito em setembro
passado, nem mesmo mencionou a crise econômica global. Sem
nenhum consenso, outros membros da Organização dos
Estados Americanos seguiram o procedimento, não assinando
o documento.
Esta não foi meramente uma questão de documentação
inadequada. A cúpula terminou sem nenhum acordo substantivo
ou qualquer proposta real para confrontar a catástrofe
econômica que varre as Américas.
As nações latino-americanas estão profundamente
divididas entre si e são incapazes de desenvolver integrações
econômicas genuínas ? ainda mais na medida em que
a crise intensifica os conflitos entre as várias nações
do continente.
A crise na América Latina ameaça lançar
mais 15 milhões de pessoas na pobreza apenas neste ano,
visto que a inflação dos preços das mercadoria,
a redução de mercados e a contração
do crédito foram projetadas pelas Nações
Unidas para contrair as economias da região em 0.3% em
2009.
Por sua vez, Obama retornou aos EUA de mão vazias. A
única nova medida que anunciou foi um programa de micro
financiamento de US$ 100 milhões para ajudar pequenos
empreendedores - menos que uma gota no oceano.
Obama também apontou a decisão de triplicar a
capacidade total de empréstimo do Fundo Monetário
Internacional. Na realidade, a maior parte do compartilhamento
desses fundos vai para os EUA e a Europa, enquanto a ajuda do
FMI à América Latina terá a forma tradicional
dos termos de punição que resultam no maior empobrecimento
dos trabalhadores.
O principal papel efetuado pelo presidente americano foi tentar
refazer a política dos EUA na região, apresentando
seu governo como uma radical ruptura com a postura confrontante
da administração Bush. Ele enfatizou que os Estados
Unidos estavam na cúpula para escutar e não
somente para falar e para avançar em uma nova relação
entre os EUA e os países ao sul, baseada no respeito
mútuo e igualdade.
A realidade é que, nas relações do hemisfério,
assim como em todas as políticas da administração
de Obama, o que está em jogo é a tentativa do governo
dos EUA de dar uma nova roupagem à mesma política
levada a cabo pela administração Bush.
Em seus discursos na cúpula, Obama enfatizou sua cor
de pele como prova e personificação das supostas
mudanças em Washington. Foi significativo que alguns dos
supostos líderes de esquerda da América Latina tenham
abraçado suas reivindicações, mesmo após
Obama ter trabalhado em seus três primeiros meses como um
constante instrumento de Wall Street e aparato da segurança
nacional, salvando os bancos, mantendo a ocupação
no Iraque e intensificando a guerra no Afeganistão,
A nova era de Chávez
Ninguém estava mais lisonjeado que o defensor da Revolução
Bolivariana e do Socialismo do século 21, o venezuelano
Hugo Chávez.
Eu quero ser seu amigo, disse Chávez ao
presidente americano antes da primeira plenária da cúpula
na última sexta-feira. Mais tarde, disse aos jornalistas
que seu aperto de mãos com Obama foi algo muito bom.
Ele acrescentou: Ele é um homem muito inteligente,
jovem... E ele é negro. Ele é um político
experiente, apesar de ser jovem.
Chávez declarou que a cúpula, que não
produziu nem um documento muito menos novas políticas,
foi o maior sucesso a que compareceu. Segundo ele,
ela abriu os portões para uma nova era de convivência
entre nossos países.
Em determinado momento, talvez o mais ridículo, Chávez
deu a Obama uma cópia de As Veias Abertas da América
Latina, livro escrito em 1971 pelo autor uruguaio Eduardo
Galeano, com uma inscrição pessoal, Para Obama,
com afeição. Será que Chávez
realmente acredita que, se Obama ler este relato histórico
das relações econômicas de exploração
que os EUA desenvolveram com a América Latina através
dos séculos, o presidente americano mudará a orientção
da política de seu país?
Quaisquer que sejam as ilusões dos líderes da
esquerda nacionalista, como Chávez, existem indubitavelmente
forças objetivas mais profundas que os levam a abraçar
Obama. A crise econômica mundial minou duramente suas economias
e ameaça desencadear um novo ascenso da luta de classes
que desafiará também seus regimes. Enquanto Chávez
tenta assegurar novos mercados para o petróleo venezuelano
na China e no Japão, os EUA ainda permanecem seu principal
consumidor, contabilizando pelo menos metade de suas exportações.
Chávez tomou a decisão de enviar um novo embaixador
à Washington - Roy Chaderton, o representante da Venezuela
na OEA - e de aceitar um embaixador dos EUA em Caracas. As relações
diplomáticas foram interrompidas em setembro passado, quando
a Venezuela expulsou o embaixador dos EUA no país, depois
de ter sido feito o mesmo pela Bolívia.
Similarmente, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega,
depois de fazer um discurso denunciando a história das
intervenções dos EUA na região, disse aos
repórteres que ele acredita que Obama será diferente.
Eu quero acreditar que ele está inclinado, que tem
vontade, afirmou.
O presidente da Bolívia, Evo Morales, teve uma visão
um pouco mais lúcida sobre a administração
de Obama. 100 dias se passaram e nós, na Bolívia,
não sentimos nenhuma mudança, afirmou. As
políticas de conspiração continuam.
Mesmo não estando na agenda, uma questão que
teve um papel central nas discussões da cúpula foi
a de Cuba, expulsa da Organização dos Estados Americanos
em 1962, após ordens de Washington. Hoje, todos os cabeças
de estado presentes no encontro, salvo Obama, estão a favor
de sua readmissão e do levantamento do embargo econômico
que os EUA mantém contra a ilha por 47 anos.
Obama enfatizou em uma conferência para a imprensa em
Trinidad que a política que tomamos durante 50 anos
não funcionou... O povo cubano não está livre.
Tal afirmação significa, na verdade, a injeção
de centenas de milhões de dólares do capital dos
EUA na ilha, procurando colher super lucros da força de
trabalho cubana, que ganha em média menos de US$ 20 por
mês. Além disso, o fluxo das mercadorias americanas
à Cuba demonstrará uma maneira muito mais eficiente
de derrubar o regime Castro do que o embargo econômico e
as conspirações da CIA.