Publicado originalmente em inglês em 19 de fevereiro
de 2009.
O presidente Hugo Chavez registrou outra vitória nas
urnas no último domingo (15.02), com o voto dos venezuelanos
para modificar a constituição e acabar com o limite
para reeleição, permitindo-lhe concorrer a outro
mandato de seis anos. A votação se deu em meio ao
avanço da crise econômica mundial e ao acirramento
da luta de classes.
A campanha pelo "sim", apoiada pelo governo, venceu
o referendum com 54.85% dos votos, enquanto 45.14% votaram pelo
"não", defendido principalmente pelos partidos
de direita, que argumentaram que o fim do limite da reeleição
significaria a consolidação da dominação
autoritária de Hugo Chavez. Cerca de 11 milhões
dos 17 milhões de venezuelanos possibilitados de votar
foram às urnas, uma alta porcentagem para os padrões
do país.
Chavez tratou o resultado como um vitória, assim como
os partidos da oposição, que trataram de evidenciar
que os 5 milhões que se opuseram à proposta é
o maior número de oposição ao governo jamais
visto. Na capital do país, Caracas, o campo do "não"
ganhou com uma margem de 9%. Não fica claro, entretanto,
se todos os que se opõem votariam nos ou defendem os partidos
da oposição, o que inclui a mais que desacreditada
Ação Democrática (Acción Democrática)
e o COPEI, ambos os partidos corruptos do "big bussines"
do país, que se alternaram no poder por décadas.
Além disso, em dezembro de 2007, uma medida semelhante
por parte do governo foi derrotada.
Falando para um multidão da sacada do palácio
presidencial de Miraflores, Chavez anunciou sua intenção
em candidatar-se novamente no próximo processo eleitoral,
em 2012.
"Em 2012 ocorrerão as eleições para
o mandato de 2013 a 2019 e, a menos que Deus queira de uma forma
diferente ou que a população deseje outra coisa,
este soldado aqui já é um pré-candidato para
a presidência da república", anunciou Chavez.
No começo deste mês, o antigo coronel paraquedista,
que surgiu na política nacional pela primeira vez como
líder de um falido golpe de estado em 1992, celebrou se
décimo ano no poder. Tendo sobrevivido a um golpe de estado
em 2002, organizado por setores militares e de direita, apoiados
pelos EUA, Chavez busca consolidar e aumentar o controle do poder
em suas mãos. Seu regime personalista se apoia nos setores
das forças armadas e em poderosos setores da elite financeira
do país enquanto, ao mesmo tempo, ganha apoio popular com
o uso do petróleo do país para financiar programas
assistencialistas (misiones) que fornecem comida, saúde,
educação, casa e especialização em
empregos.
Em seu discurso de vitória, Chavez saudou o fortalecimento
desses programas, mas, em seguida, se voltou às questões
sobre as quais a oposição baseou sua campanha: a
alta taxa da criminalidade nas cidades e a corrupção
no governo, assinalando que seu governo buscará "lutar
contra esses problemas".
Apesar das promessas de Chavez em estender seus programas sociais
e nacionalizações parciais - uma política
que chama de "socialismo do século XXI" - o impacto
da crise do capitalismo mundial sobre a Venezuela está
ameaçando os fundamentos econômicos de tal política.
A Venezuela se mantém ainda quase que totalmente dependente
do petróleo, que representa 80% de seus recursos de exportação.
A queda brusca no preço do petróleo - que caiu quase
US$ 100/barril em apenas seis meses - espera-se que se reverta
em perdas de US$ 10 bilhões para o país neste ano.
É amplamente anunciado pelos analistas econômicos
e políticos venezuelanos que o governo Chavez usará
a consolidação de seu poder pelas urnas para realizar
uma rígida política fiscal com cortes nos gastos
sociais e internos ao país, assim como na ajuda que tem
mantido mantido com outras nações sul-americanas.
O jornal venezuelano Universal informou na quarta-feira
que os mais altos oficiais do governo reconheceram que "algumas
medidas econômicas serão implementadas", enquanto
alegavam que não se trataria de um "choque social"
para a maioria da população do país. Por
sua vez, o Ministro das Finanças do país, Ali Rodriguez,
disse à mídia no domingo que o governo não
implementaria qualquer pacote "neo-liberal", entre as
medidas já antecipadas estão cortes nos orçamento,
aumento nos impostos e desvalorização de 25 a 30%
do bolívar (moeda local).
Enquanto isso, a inflação saltou para 30,7%,
comparada a 24,1% no último ano e a taxa de crescimetno
do país tem caído dramaticamente. O crescimento
econômico interno ao país no último semestre
de 2008 caiu 2%, se comparado com os 8,5% durante o mesmo período
de 2007.
Uma completa evidência desta queda é a redução
de 43% nas vendas automotivas no último mês, se comparada
a janeiro de 2008, o que acarrretou demissões na industria
automotiva assim como na produção de metal e alumínio
e outros suprimentos.
O resultado inevitável desse aprofundamento da crise
econômica será a intensificação dos
conflitos de classe no país, que, por sua vez, deve expor
de maneira mais aguda as divisões de classe do movimento
autodenominado chavista.
Chavez trabalha incansavelmente para acabar com tais divisões
no seio do seu movimento, se colocando ao mesmo tempo como o líder
das massas trabalhadoras venezuelanas e provedor dos mais altos
lucros aos bancos internacionais e nacionais. Além disso,
criou toda uma nova camada da sociedade, conhecida no país
como a boliburguesia (a burguesia surgida no seio da "Revolução
Bolivariana" de Chavez), que enriqueceu através das
ligações com o governo ou mesmo por meio da corrupção
financeira.
Da mesma forma, o governo tem buscado conter qualquer oposição
de esquerda, arrebanhando várias organizações
dentro do seu partido controlado burocraticamente, o Partido Socialista
Unificado da Venezuela (PSUV), que atua como veículo eleitoral
de Chavez.
Com a inflação exercendo uma pressão crscente
sobre os salários e novos ataques aos empregos, os trabalhadores
venezuelanos têm respondido com greves combativas que rapidamente
se desdobram em violentos confrontos com as forças estatais.
Em 29 de janeiro, a polícia atirou e matou dois trabalhadores
metalúrgicos em uma assembléia de trabalhadores
que se realizava na planta da Mitsubishi, no estado de Anzoátegui.
Os trsbalhadores ocuparam a fábrica em apoio aos 135 trabalhadores
da limpeza e manutenção que foram demitidos. Além
dos dois operários mortos - José Gabriel Marcano
Hurtado, 36 anos, operário da Mitsubishi e Pedro Suárez
Poito, 23 anos, trabalhador de uma fábrica de autopeças
que havia se somado ao protesto - ao menos outros seis operários
foram atingidos pelos tiros da polícia.
Ainda que o governo Chavez supostamente tenha proibido os cortes
massivos empregos, eles acontecem com relativa impunidade. Ao
invés de apoiar os direitos dos trabalhadores da Mitsubishi,
os tribunais intervieram em defesa dos patrões, ordenando
a evacuação da assembléia e enviando a polícia
e as tropas da guarda nacional para garantir o corte nos empregos.
O governador do estado, responsável pelas forças
de segurança locais, é Tarek Willians Saab, uma
das principais figuras do PSUV de Chavez.
Inicialmente, tanto Chavez quanto Saab reproduziram o discurso
da empresa, afirmando que não ficava claro quem havia disparado
contra os trabalhadores. A Mitsubishi falsamente afirmava que
os trabalhadores estavam armados. Em seguida, Saab afastou os
policiais envolvidos, afirmando que haviam violado uma regulação
aos usarem armas-de-fogo nesse tipo de confrontos.
Os trabalhadores continuaram a ocupação da fábrica
após os assassinatos, reivindicando a readmissão
dos demitidos e ainda outras demandas.
Este assassinato seguiu o ocorrido no último mês
de novembro, quando três dirigentes sindicais de esquerda
- Richard Gallardo, Luis Hernández e Carlos Requena - foram
assassinados no estado venezuelano de Araqua após a ocupação
de uma fábrica de leite colombiana, desmantelada violentamente
pela polícia. As autoridades ainda não prenderam
os responsáveis.
No último ano, Chavez afirmou que sua política
atingirá as metas por meio de uma "aliança
estratégica com a burguesia nacional". A verdade é
que ele lidera um governo burguês que adota a cada dia métodos
cada vez mais bonapartistas em busca de controlar e suprimir os
conflitos de classe e, assim, defender o capitalismo venezuelano
da ameaça de uma verdadeira revolução socialista.
O recente ataque violento à luta dos trabalhadores evidencia
a urgência de que os trabalhadores venezuelanos se organizem
independentemente do governo e contra o governo, bem como contra
sua oposição de direita.